domingo, 23 de setembro de 2012

Sem nome


Meus seios batem nos céus e nos mares
e a música me transporta do quintal
                       de minha casa
para os anéis de qualquer planeta perdido.
Em minha cabeça degolada amadurece
um pensamento impossível.
Mais uma vez não vou por bem vou por mal.


Cacaso

sexta-feira, 21 de setembro de 2012




















annie
a febre
não quer passar

o tempo passa
porque não existe

o temporal lá fora
abafa o teu gemido

não grita, annie
que no quarto ao lado
alguém parece dormir

como engolir a lorota
a podre piada divina?

o universo
não tem sintaxe
a vida
sentido

e a natureza
essa puta louca
inventa monstros
microscópicos
que sabem
sugar os sonhos

a noite é longa, annie
na verdade infinita
na verdade não há noite
porque olhos são precisos

e enquanto
a pedra lá fora
espera teu breve nome
teu corpo breve
teu inútil sonho

uma ameba desperta
preguiçosamente
no intestino
de algum porco


Carlos Moreira

Com foto de Lee Jeffries.

“Deixo aos vários futuros (não a todos) meu jardim de caminhos que se bifurcam.”

Ts’ui Pen, personagem de Jorge Luis Borges.

domingo, 16 de setembro de 2012

Paz

Os caminhos estão descansando.

Mario Quintana

sábado, 15 de setembro de 2012



















você está
aí aqui
em algum lugar?

você demora
ainda
esse não estar?

ou se atira
pedra bala mira
tempo afora

até o incerto
te acertar?


Carlos Moreira

Com imagem de Ernst Haas.

sexta-feira, 7 de setembro de 2012
















Mas, por trás das defesas, esse vinco no canto esquerdo da boca continua avançando, cada vez mais fundo, cada vez mais longo. Você tenta reagir, sem dizer claramente não, pelo amor de Deus, não me dá esse disco pra ouvir, eu não entendo nada de música, eu não conheço John Lennon e nunca ouvi falar em Yoko Ono. Eu não tenho tempo. Não posso parar, nem pensar, nem sentir. Nem lembrar. Eu preciso ganhar dinheiro. Tenho pressa neste passo alucinado em direção ao buraco-negro do futuro.

Mas você acaba aceitando. Agora somos profissionais. Coloca no toca-discos, como quem não quer nada. Liga a TV, ao mesmo tempo. E no meio dos sons que vêm também da rua e dos outros apartamentos, de repente aquela voz tão antiga e conhecida grita:

- Mother!

Aumente o volume. Ou desligue para sempre, você me entende?


Caio Fernando Abreu

Trecho de Pra machucar os corações, publicado no jornal O Estado de São Paulo, em 6 de abril de 1986.